março 14, 2013

O vento de Béla Tarr


Confesso que vi o Cavalo de Turim em dois ou três dias, porque adormeci. Não imputo total responsabilidade ao filme porque provavelmente também pesou o cansaço dos meus dias, mas quando acabei de o ver escrevi um poema que não cabe aqui reproduzir. Mas foi isto que o filme meu deu, um poema. E nos dias que correm, com uma desinspiração de versos latente, isso só pode ser uma coisa boa. E o Cavalo de Turim foi uma coisa boa que aconteceu o ano passado.
Não será digerível para a maioria das pessoas e quem não lhe reconhece o valor ou o mérito não merece castigo. É uma questão de gosto, sensibilidade ou disponibilidade e isso não se discute. É verdade que ao longo do filme está sempre a passar a mesma música, é verdade que somos confrontados sempre com as mesmas tristes rotinas uma vez e outra e outra vez, é verdade que há poucas falas e que há sobretudo silêncios e vento, muito vento. Confrontados com esta afronta aos nossos sentidos que pode fazer exasperar até os mais pacientes levando à desistência do filme, é bom reconhecer que também nós, confrontados diariamente com os mesmos problemas, com os mesmos acordares, com os mesmos hábitos e despertares, com as mesmas pessoas ou com os mesmos lugares, não desistimos das nossas vidas. Nós continuamos, uns mais conformados do que outros, mas continuamos. A nossa vida é em si um acumular de rotinas e excessos de desmedidas banalidades, apenas mudam os objectos a que nos agarramos e que determinam as nossas prioridades. 
Sem grandes pretensões, tal a vida dos mais simples, o Cavalo de Turim de Béla Tarr manifesta a pureza do objectivo, a luta pela sobrevivência, um cuidar até à morte daquilo que nos é querido e uma homenagem a quem resiste contra a ventania.

3 comentários:

  1. Bom texto, apesar de o filme não me dizer muito. A parte técnica é fantástica e, indo de encontro ao que escreves, acho interessante quando a repetição equivale a transformação, mas não me parece que Tarr atinja esse efeito.

    Boa sorte com o blog :)

    ResponderEliminar
  2. Já tinha tentado ver esse filme anteriormente e só o consegui ver na íntegra com uma segunda visualização passado bastante tempo, acho que precisava de estar com um estado de espírito correcto. Concordo contigo, não é um filme para qualquer um devido ao seu ritmo um tanto ou quanto cansativo. O trabalho de câmara é deveras grandioso, tal como a fotografia. A música é realmente hipnotizante, ficou-me na cabeça durante vários dias. E o melhor do filme é o plano-sequência inicial.

    Cumprimentos,
    Rafael Santos
    Memento mori

    ResponderEliminar
  3. Eis a minha opinião - http://ohomemquesabiademasiado.blogspot.pt/search?q=o+fim+de+tudo

    ResponderEliminar